(Meu) Top 20 da CCXP Worlds 2020

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por Bruno Porto

O raiúca Bruno Porto cobriu a programação de quadrinhos da CCXP Worlds: A Journey of Hope - o mega evento online que substituiu a maior convenção de cultura pop do continente em tempos pandêmicos - e teceu suas considerações e indicações do que vale ser conferido… e do que pode ser melhorado para o ano que vem.

As 150 horas de conteúdo divididas por cinco canais (ou “palcos” virtuais) da CCXP Worlds: A Journey of Hope foram acessadas por 1,5 milhão de pessoas de 113 países entre 4 e 6 de dezembro - e isso sem contar as mais de duzentas lives diárias que os 589 quadrinistas fizeram de suas mesas virtuais no Artists Valley. Ou seja, mesmo que houvesse sentido e interesse, seria impossível ter assistido tudo. Mas deu para ver muito das 30 horas de conteúdo específico sobre quadrinhos, até por que a programação completa de cada um dos dias era disponibilizada para ser vista logo após seu término - e isto acontece até o próximo dia 13 para quem adquiriu quaisquer dos ingressos pagos do evento, a partir de R$35. Cadastrando-se na plataforma, era possível assistir a tudo gratuitamente, mas só na hora mesmo. Hmm, como televisão no século passado.

Justamente porque ainda há este prazo até o próximo domingo (e por que é provável que esse conteúdo seja eventualmente disponibilizado), montei esta lista do que considero imperdível para quem gosta de quadrinhos (ou, como o recorte é pessoal: para quem gosta dos quadrinhos e afins de que eu gosto). Algumas das indicações podem ser conferidas até mesmo por quem não comprou ingresso, pois estão disponíveis no YouTube. Leiam rápido e aproveitem!

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É sempre bom escutar Neil Gaiman, Marcello Quintanilha e Trina Robbins falarem, mas esta edição foi particularmente feliz em convidar interlocutores que tivessem alguma relação com a obra do entrevistado. A escolha certa diminuía a distância (acentuada pelas calls virtuais) e transformou momentos das entrevistas em verdadeiros bate-papos. Para entender melhor do que estou falando, não deixem de assistir as conversas entre Kelly Sue Deconnick e Cris Peter, Art Spiegelman e Érico Assis, Gerry Conway e Marcelo Naranjo, Jéssica Groke e Ivan Costa, Fábio Moon e Matt Fraction (ou Jeff Smith, ambas são ótimas!), e, se design e direção de arte estiver entre seus interesses, entre mim e Chip Kidd.

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A conversa entre Les Week e Anthony Marques não se encaixa na descrição acima não por não ter a cumplicidade entre os participantes - ambos são quadrinistas e professores da The Kubert School - mas por que além do papo ter fluido facilmente, analisaram capas e splash pages numa masterclass disfarçada. Particularmente imperdível.

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A programação de lives do Chiaroscuro Studios, em um canal separado, foi muito bem vinda não apenas pela diversidade de tópicos e participantes (que refletem a abrangência de profissionais que a agência representa) mas por que a programação geral aparentemente estava com um atraso de cerca de vinte minutos, então era sempre um porto seguro em qualidade. Esses vídeos estão todos no canal do GEEQ no YouTube , então não precisa ter pressa em assistir.

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O âmbito digital dos quadrinhos - tanto nas ferramentas de produção como no suporte em si - permeou diversas conversas, mas destaco Bem vindo a Funny Creek, entre os autores da HQ digital lançada pela comiXology Originals Eduardo Medeiros, Priscilla Tramontano, Rafael Albuquerque e Rafael Scavone; Jornada das HQs: Arte Digital com os quadrinistas Lucas Werneck, Rafael Pimentel, RB Silva, Rogê Antônio e Zé Carlos; e O Panorama das HQs no Brasil após 2020 com Andréia Fernandes, Carlos Hollanda, Heitor Pitombo, Octavio Aragão, Renato Lima e este seu escriba. Estas duas últimas estão disponíveis no YouTube, então também não precisa ter pressa.

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Acontecer remotamente estimulou a exploração de outros formatos de atrações além de entrevistas, painéis, debates e afins existentes nos eventos presenciais. Isso possibilitou a veiculação de snippets de 5 a 15 minutos entre as atrações (que geralmente eram entre 30 e 60) com breves depoimentos e causos contados pelos quadrinistas, que podiam falar das HQs marcantes em suas vidas, de seus animais de estimação (deve haver quem se interesse...) ou exibir peças das suas coleções de artes originais e de memorabilia de quadrinhos. Recomendo ver o quadro My Precious com as coleções de Daniel HDR, Renato Frigo e Ricardo Leite.

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Quem explorou de maneira bem sucedida essa possibilidade de pré-gravar e editar sua participação foram Fábio Moon e Gabriel Bá no Moon & Bá Show, um bem humorado mini-documentário de meia-hora abordando como tem sido trabalhar durante a pandemia, o que ambos têm feito, próximas publicações etc. Vale mencionar que na semana que antecedeu a CCXP Worlds, a dupla fez uma série de lives no Instagram, desenhando e interagindo com os espectadores, o que de certa forma serviu como complemento ao vídeo.

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Foi bom também acompanhar alguns painéis promovidos por editoras, selos e plataformas editoriais falando de seus planos e projetos. Reclama-se da ausência das pequenas e médias editoras de quadrinhos nos megaeventos por não poderem arcar com os custos de participação, mas este formato online permite mais equilíbrio neste sentido. Destaco o announcement do novo formato do Social Comics (outra inserção de quadrinhos em suporte digital), em meio a novidades como as novas Graphic MSP, o retorno do Jaspion pela JBC, a linha DC Future State, e presenças da Conrad, Bruttal e Panini Brasil, entre outros.

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As mesas virtuais do Artists Valley foram outro ponto alto do evento para mim - que confesso sentir certo incômodo ao percorrer os corredores de feiras (não me peçam para explicar, faço terapia) - por permitir conhecer uma produção absurdamente variada e inteligentemente indexada por tipo de trabalho, gênero (de trabalho e de artista) e país de origem (além de Brasil, estavam indicados Alemanha, Argentina, Chile, Colômbia, EUA, Hong Kong, Irlanda e Países Baixos). O fato da inscrição desta edição ter sido gratuita me alegra mais ainda, e deixo a sugestão para que este formato aconteça também quando do retorno do evento presencial, complementando-o e ampliando de forma democrática seu alcance.

TOP 3 Problemas

Obviamente nem tudo correu suavemente, porque qualquer convenção ou feira de quadrinhos (ou Bienal do Livro, festival de rock etc) tem seus percalços e uma longa lista de problemas persistentes, alguns insolúveis, e imprevistos técnicos. De falhas no microfone e áudio baixo à dificuldades de localização de estandes, das enormes filas para tudo às raras opções decentes de alimentação, de autores que simplesmente não rendem em um conversa a entrevistadores pouco preparados. Para o saldo do evento ser bom, é preciso que os prós triunfem sobre estes contras. Foi o que aconteceu nesta primeira edição da CCXP Worlds, extraordinária (principalmente em suas intenções) mas com alguns pontos ainda a melhorar. Listo abaixo algumas sugestões para a próxima edição - sim, por que mesmo que a data da CCXP 2021 já tenha sido anunciada (2 a 5 de dezembro do ano que vem), vejo vantagens fabulosas neste formato que podem ser facilmente incorporadas ao evento físico.

Em se tratando de um evento inteiramente virtual, é preciso dizer que a navegação do site não é intuitiva de imediato, e permitir acesso a ele e à programação (mesmo que incompleta ou temporária) alguns dias antes teria sido de grande ajuda para muitas pessoas. Embora os cinco “palcos” estivessem bem sinalizados cromaticamente (Thunder Arena em rosa, Artists Valley em roxo, Omelete Stage em amarelo, Creators & Cosplay em Vermelho e Game Arena em verde), facilitaria muito uma hierarquia visual equivalente para diferenciar os três dias de evento.

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A navegação na grade horizontal da programação também era desconfortável, de difícil visualização até pros títulos de muitas atrações, o equivalente a uma planilha de Excel com algumas imagens (nem sempre representativas). Compreendo também que existam motivos - técnicos e estratégicos - para que mais de uma atração não possa ser assistida simultaneamente (afinal, é assim no evento presencial, não?), mas a grade de horários deveria poder ser consultada em paralelo, não obrigando o usuário a sair do canal que está assistindo para ir ver as próximas atrações. Claro que dava para ter feito uma gambiarra de capturar a tela, mas o design da grade não facilitava nem para isso... Se isso não for solucionável, que tal ao menos um PDF para baixar na próxima?

Como escrevi acima, imprevistos técnicos são inevitáveis, e a baixa qualidade de vídeo, engasgos de som e imagem de alguns entrevistados equivalem ao microfone baixo dos eventos ao vivo, mas não apenas já temos um certo traquejo de Lives, Whatsapp, Skype e similares, principalmente nos último tempos, como crescemos escutando correspondentes internacionais no Jornal Nacional com áudio e som picados. Então tudo bem que o mapa tridimensional não carregava e que a imagem do Esteban Maroto praticamente não se mexia de tão pixelada (o áudio estava tranquilo). Dito isso, foi esquisito ver uma grande variação de tipos de legendas nas entrevistas, provavelmente devido a colossal quantidade de conteúdo. Enquanto algumas conversas foram claramente traduzidas e legendadas com esmero e antecedência, outras pareciam receber aquela legendagem automática baseada no áudio, com os habituais erros crassos (como ler o Jeff Smith mencionar seu personagem “ossinho”). Mas devo deixar registrado que foi lindo ter tradução para Libras de praticamente tudo. Por último, fica a sugestão para deixar opcional para o usuário esconder tanto as legendas como o chat lateral, como de praxe. Certamente nos vemos em 2021!