Angeli: minerador de crises
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Esta estreia, nas colaborações, do meu irmão Luiz Gustavo Marcondes tem sabor especial. Primeiro: porque a promessa de colaboração já vem de longa data. e finalmente se deu. Segundo: porque Guga se predispôs a cobrir, com ótimas fotos, esta incrível expo do Angeli, em nem eu nem Pedro pudemos conferir. E ainda num fim de semana futebolístico complicado (salve, tricolor paulista!). Terceiro: porque seu texto tem uma clareza sintética e ao mesmo tempo objetividade crítica que às vezes faltam aos rocambólicos escribas daqui. Gustavo é jornalista do Correio Braziliense, e escreve para o melhor Caderno de Esportes do Brasil. É aficcionado por cultura pop e arte em geral, e curte, é claro, quadrinhos além. (CIM)
texto e fotos por Gustavo Marcondes
Em um dos vídeos que
faz parte da exposição Ocupação Angeli – aberta apenas até o
domingo 6 de maio, com entrada gratuita –, em São Paulo , o cartunista
diz que perdeu o tato para escrever e desenhar “tiras”. Uma confissão franca e
que não esconde o cansaço criativo do artista de 55 anos com relação ao formato
que o consagrou, ainda nos anos 1970. Um passeio com calma pela pequena sala do
Itaú Cultural, na Avenida Paulista, porém, pode indicar que a coisa não vai tão
mal assim.
Nos trabalhos mais recentes, Angeli realmente
opta pela charge, que, em vez da tira em dois, três ou mais quadros, é formada
por uma única imagem. É assim que ele prefere, hoje, escancarar a sordidez do
poder ou a monotonia/o vazio/o caos das metrópoles. E os muitos exemplos na Ocupação mostram que também nesse modelo ele
atingiu a excelência. Em uma das paredes da exposição, por exemplo, 19 enormes
charges mostram a visão Angeli do poder. Numa das mais legais, dezenas de
bandidos armados com metralhadores se escondem na sombra da estátua da Justiça,
cega. Em outra, a entrada de uma paranoica São Paulo é separada: de um
lado entram os fumantes; do outro, os não fumantes. Mais atual impossível.
Há um espaço bastante generoso dedicado a uma
das séries mais recentes da obra dele: Angeli em Crise. Dezenas de
imagens do cartunista sentado em seu estúdio, fumando, pensando, bebendo,
agoniando-se, questionando a profissão, fumando mais... A crise dos 50, como
ele admite no vídeo gravado para a exposição. Mas só para ele. Pois o conjunto
das tiras – sim, a maioria delas no formato de tiras de três quadros – mostra
um artista que se recria bebendo da suposta falta de criatividade. Ave Angeli!
Ocupação Angeli
Até 6 de maio no Itaú
Cultural, Avenida Paulista 149, Metrô Brigadeiro, das 11h às 20h